Lição de vida: professora da rede estadual enfrenta câncer de mama e dá aula de coragem

Em bom momento da vida pessoal e profissional, Elizete Regina, que há 22 anos atua na rede estadual de ensino, recebeu o diagnóstico que lhe tirou o chão. Mas enfrentou a doença com força e otimismo e agora, já no final do tratamento, orienta as mulheres a não descuidarem da saúde.
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31/03/2023 - 08:10
Editoria

“A coisa é séria, mas mês que vem eu estou de volta”. Foi dessa forma que Elizete Regina Burigo, 53, deu aos colegas do Núcleo Regional de Educação de Paranaguá a notícia de que estava com câncer de mama. Era julho de 2022 e, poucas horas depois de receber o diagnóstico, mal sentia o chão sob os pés tamanho o impacto da notícia dada pelo mastologista.

Hoje, passados oito meses do tratamento contra a neoplasia, Elizete se considera uma guerreira por vencer a doença e afirma que a luta valeu a pena. Agora, está preparada para dar quantas lições de coragem os alunos pedirem.

Na última reportagem da série do Mês da Mulher, a Secretaria de Estado da Educação e a Agência Estadual de Notícias contam mais uma história de força e superação, provando que, para além das dinâmicas em sala de aula, as mulheres que atuam na rede estadual dão também exemplos de coragem, determinação e perseverança.

Elizete atua na rede estadual há mais de duas décadas. No início de 2022, com pouco mais de três anos à frente da equipe pedagógica do Núcleo Regional de Paranaguá, vivia, segundo ela própria, um dos melhores momentos da vida. Compunha a equipe do programa “Presente na Escola”, que combate a evasão escolar nas instituições de ensino estaduais e tem o desafio de aumentar a frequência dos alunos em sala de aula.

“Como em todas as escolas, depois do período pandêmico a evasão de alunos despontou como um grande desafio para as entidades administrativas estudantis. A partir do intenso trabalho que desempenhamos por meio do NRE, nos primeiros oito meses depois da flexibilização do isolamento alcançamos um aumento de 15% na frequência às aulas nas escolas do Litoral. Tudo estava voltando aos eixos”, lembra.

A vida pessoal corria ainda melhor. “Minha filha mais nova tinha acabado de se casar e a ocasião foi celebrada com muita alegria por toda a família. Eu estava radiante. Até que, uma semana depois, meu filho mais velho anunciou a gestação da minha primeira neta. Era só felicidade”, afirma.

Poucas semanas depois, porém, o diagnóstico inesperado impactaria profundamente a saúde emocional de Elizete. “Meus colegas do Núcleo Regional de Educação de Paranaguá comentavam que eu estava magra demais. Quase todo o dia alguém vinha perguntar se estava tudo bem com a minha saúde. Decidi fazer o check-up e, durante a ecografia, a enfermeira identificou um nódulo grande. Poucos dias depois, num exame mais aprofundado, o mastologista confirmou que era mesmo câncer”, conta.

Sozinha e receosa, Elizete conta que não se recorda de como retornou ao NRE de Paranaguá após a notícia. “Assim como todos os pacientes que são pegos de surpresa, na hora, eu fiquei no chão. Foi difícil para todo mundo. Lembro de chegar no Núcleo e dizer que eu precisaria de alguns dias, o que prova que eu não tinha ideia do tempo que levaria o tratamento”, lembra a professora, que contou com apoio total dos colegas para agendar exames em Curitiba e também para dar a notícia à família.

RECUPERAÇÃO – Depois da notícia, o que mais ela temia era a quimioterapia. "Quando os médicos disseram que eu teria que recorrer ao tratamento químico, foi um novo choque”, afirma. Após as primeiras sessões do tratamento, no entanto, Elizete percebeu que – apesar dos efeitos colaterais – ânimo e positividade não lhe faltavam.

“Eu não me sentia doente. Não tive medo de morrer. Vi que era possível viver a vida, apesar do tratamento. No entanto, algo ainda me amedrontava: a hora que meu cabelo começasse a cair”, conta.

Com o passar das sessões, Elizete tirou de letra o inevitável efeito colateral. “Depois de sofrer com a ideia de perder o cabelo, achei que raspar seria mesmo a melhor escolha. Encontrei forças e, de alguma forma, me convenci de que tudo aquilo iria passar”, comenta.

O processo foi longo, porém repleto de aprendizado. Segundo Elizete, a ansiedade inicial em apressar o processo foi substituída por doses diárias de esperança e paciência. “Eu via casos de mulheres que seguiam com a rotina de trabalho em pleno tratamento. São histórias admiráveis e relutei muito em me afastar do trabalho. Para mim, no entanto, essa foi a melhor decisão. Cada caso é um caso e, no meu, descansar e focar na recuperação foi importante”, diz.

Comuns entre pacientes de câncer, picos de pânico e depressão representam uma das partes mais difíceis no enfrentamento à doença. Segundo dados publicados pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca), cerca de 31% dos pacientes diagnosticados sofrem com transtornos depressivos associados ao quadro. Com Elizete não foi diferente.

Mas ela afirma que recordar a trajetória profissional e pensar na neta recém-nascida foram o combustível de que precisava para persistir. “Todos os dias eu pensava em voltar ao trabalho. Ser educadora é fazer parte da história do aprendizado e da vida dos alunos. É a partir da sala de aula e do processo educacional que o estudante decide os rumos da vida e, para mim, integrar este processo é uma vocação. E minha missão não tinha acabado. Pensar nisso e na minha vida como avó foi o que me impulsionou a seguir em frente”, revela. 

Hoje, faltando pouco para o fim do tratamento, Elizete comemora. O quadro está limpo para uma nova história. Praticamente livre da rotina de quimioterapias e remédios fortes, a professora incentiva as mulheres a ficarem atentas à saúde. “Muita gente pensa que o câncer de mama só atinge mulheres mais velhas ou com antecedentes genéticos. Na verdade, a doença atinge mulheres de todas as idades, sendo apenas 5% dos casos decorrentes do fator genético”, alerta.

Neoplasia mais comum entre mulheres em todo o mundo, o câncer de mama acomete milhares de pessoas anualmente. Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca), estima-se mais de 57 mil novos registros da doença a cada ano no Brasil. Segundo o instituto, mulheres a partir dos 50 anos são mais propensas a desenvolver a doença, porém isso tem mudado. Na última década o número de mulheres com menos de 35 anos acometidas pela neoplasia aumentou significativamente, representando cerca de 5% do total de novos casos.

"É importante cuidar da saúde sempre. E se a doença chegar, é preciso pensar que o tratamento passa, a vida continua e, no final, saímos melhores depois da tempestade”, finaliza. 

No fim das contas, depois das duas tempestades seguidas (pandemia e câncer), ela se sente preparada para voltar, assim como aqueles alunos que eventualmente deixaram os estudos. Nessa improvável prova de vida, sua nota foi 10.

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